Friday, June 13, 2008

 

Janela no Outono

Janela de quarto de hotel, debruçada sobre a estação dos comboios.
Janela de carruagem de comboio, debruçada sobre a paisagem.
Lá fora as folhas dos carvalhos sucedem-se, ficam castanhas e caem, outras aproveitam a oportunidade e quando sentem a árvore nua vão cobrindo-a de rebentos verdes e tímidos primeiro, verdes e alvoroçados depois.
Enverdecida a árvore tornam a acastanhar-se e a cair.
Partem para o chão e o vento enrola-as em rodopios de valsa até que a chuva as amaine.
Embalam-se em regos de água, parecem navios pequeninos a correr em rios menores. Partem de alegria a entupir sarjetas. Voltam no ano que vem. Em verde.
Lá fora passam casas, vinhas, sobreiros que não mudam de cor, mais casas e mais sobreiros.
Às vezes um olival ou um pomar de laranjas passam também a correr para trás e sem mudar de cor.
Passa um vento frio, uma aragem nas estações mortas de terras que já não existem ou que existem pouco, tão pouco que já nem o comboio lá para. Gemem de saudade as janelas vazias da sala de espera, suspiram ao passar das carruagens.
Da janela do quarto de hotel vê-se uma mulher no Largo da Estação a abrigar da chuva com o corpo o filho.
O filho não compreende, é pequeno e não tem a memória do Outono.
A chuva enrola-se nele protectora e fá-lo tremer de frio.
A mãe atravessa a rua com ele pela mão, desaparecem engolidos por uma entrada para o metro.
Os pombos da praça fugiram da estátua do Senhor de bigode e espada desembainhada que olha a estação do comboio com ar vingador, estão agora albergados no hotel. Como eu.

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