Friday, April 13, 2007

 

Crónicas de viagem do meu tio que se perdeu na América e cujo achamento se comemora no primeiro dia de Março de cada ano. A Latagónia.

A Latagónia é um país em que todas as personagens são de ficção.
O Presidente é de ficção, os animadores culturais são de ficção e até as artistas de variedades usam ramos de camélias que indicam pela cor para que género ficcional estão inclinadas.
Hoje sinto-me poesia, diz a do ramo de camélias encarnadas ao peito.
Criticam-lhe as outras a métrica em camélias azuis de inveja.
A chuva é de ficção e não molha, pelo que o palco em que a Latagónia se desenrola está normalmente seco.
Às vezes um jardineiro pega num regador e finge que rega a horta de fingir da boca de cena.
Na Latagónia um beijo não é um beijo, é um olhar apaixonado seguido de duas pessoas que juntam as respirações a fingir que se encostam uma à outra.
Nem as casas são casas, são só a parte da frente. Por detrás da fachada colunas de madeira sustentam a ficção como se fossem espectadores à espera em bicha junto à bilheteira do cinema.

Tuesday, April 10, 2007

 

A Páscoa é a arte de transformar as pedras mortas em coisas vivas.

Pega-se numa pedra, não numa pedra qualquer mas num ovo, que é uma pedra que tem coisas a dormir lá dentro.
Aquece-se ao Sol.
Deixa-se que os raios o penetrem, o aqueçam, o embalem.

Espera-se com paciência que chegue o Equinócio da Primavera.

Nessa altura repare-se com atenção: A pedra parte-se e de lá de dentro mexe-se uma coisa viva.

Não se sabe como foi lá posta porque a pedra não tem orifício de entrada. Não se sabe como aparece viva porque ainda logo antes era uma pedra morta.
Guarda-se na memória com atenção porque mal chegou já passou.

E tem sido assim desde há tempos.
Já era assim quando nasci.
Já era assim quando não houve tempo de deixar o pão levedar antes de iniciar a fuga para o lado da Primavera.

Tem sido assim.

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